segunda-feira, setembro 1

Jean Paul - "Discurso do Cristo morto, desde o cume do mundo, sobre a não existência de Deus"

Pela meia noite e em pleno cemitério, numa visão apavorante, o olhar estende-se até aos confins da noite cósmica esvaziada, os túmulos estão abertos, e, num universo que se abala, as sombras voláteis dos mortos estremecem, aguardando, aparentemente, a ressurreição. É então que, desde o alto, surge Cristo, uma figura eminentemente nobre e arrasada por uma dor sem nome. E, com um terrível pressentimento, os mortos todos gritam-lhe: "Cristo, não há Deus?" Ele respondeu: "Não, não há Deus". A sombra de cada morto estremeceu, e umas a seguir às outras desconjuntaram-se. E Cristo continuou, anunciando o que aconteceu no instante da sua própria morte: "Atravessei os mundos, subi até aos sóis, voei com as galáxias através dos desertos do céu; e não há Deus. Desci até onde o ser estende as suas sombras, e olhei para o abismo, gritando: 'Pai, onde estás?' Mas apenas ouvi a tormenta eterna, que ninguém rege". "Quando, no espaço incomensurável, procurei o olhar divino, não o encontrei; apenas o cosmos infindo me fixou petrificado com uma órbita ocular vazia e sem fundo, e a eternidade jazia sobre o caos e roía-o e ruminava-se". O coração estalou de dor, quando as crianças sepultadas no cemitério se lançaram para Cristo, perguntando: "Jesus, não temos pai?" E ele, debulhado em lágrimas, respondeu: "somos todos órfãos, eu e vós, não temos pai. Nada imóvel, petrificado e mudo! Necessidade fria e eterna! Acaso louco e absurdo! Como estamos todos tão sós na tumba ilimitada do universo! Eu estou apenas junto de mim. Ó Pai, ó pai! Onde está o teu peito infinito, para descansar nele? Ah! Se cada um é o seu próprio criador e pai, porque não há-de poder ser também o seu próprio anjo exterminador?"

Que belo sonho de verão... prometo o texto integral para breve... assim que terminar a tradução... Até lá, bons sonhos!